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Ao longo das últimas três décadas não houve qualquer esforço significativo para construir uma estratégia nacional que permita desenvolver o Setor de TI à altura do tamanho da economia brasileira Dados macroeconômicos revelam que o Brasil possui um dos menores fluxos de comércio internacional (relação entre a soma das exportações e as importações com o […]
Dados macroeconômicos revelam que o Brasil possui um dos menores fluxos de comércio internacional (relação entre a soma das exportações e as importações com o PIB) entre as principais economias do planeta. Nas últimas duas décadas, a pauta das exportações tem se concentrado cada vez mais em ‘commodities’: produtos exportados com pouco valor agregado, em detrimento das exportações de produtos industriais, por exemplo. Minérios, carnes e grãos são transformados em produtos de maior valor em outros países.
No que diz respeito à Tecnologia da Informação, nossa balança de pagamentos internacional não é diferente: a importação de equipamentos e componentes, software e serviços é cerca de uma ordem de grandeza maior que as exportações. Ao mesmo tempo, dado o tamanho da nossa economia, a demanda por estes produtos e serviços de TI cresce cada vez mais.
Entretanto, ao longo das últimas três décadas não houve qualquer esforço significativo para construir uma estratégia nacional que permita mudar essa situação no Setor de TI.
Ao longo das décadas foram implementadas algumas políticas públicas para o Setor, mas sempre de forma fragmentada, muitas vezes sem continuidade, e outras com qualidade de implementação muito baixa.
Apenas para citar alguns exemplos, a política de software livre redundou no aumento da contratação de funcionários públicos, deixando as empresas de TI em situação inferior à de países onde esse tipo de software não recebeu qualquer incentivo. Na mesma linha, a tentativa de transformar o Brasil em polo de outsourcing de serviços de TI acabou tropeçando não apenas nos nossos custos internos, mas na capacidade limitada de dispor de recursos humanos especializados – essa é uma realidade comum a todos os países onde a economia como um todo e as suas sociedades adotaram o uso da TI de forma intensiva (e por isso, esses países, ao contrário do Brasil, estão abertos à imigração de profissionais capacitados em TI).
Adicionalmente, os incentivos fragmentados, concedidos nas últimas décadas para baratear equipamentos, incentivar pesquisa e desenvolvimento, por exemplo, foram sacrificados formalmente ou sucateados na prática pelo não aporte de recursos ao longo de 2015, com a justificativa da necessidade de termos um ajuste fiscal no país. Nessa linha perdemos os benefícios da Lei do Bem (ao menos por alguns anos), os befícios concedidos a empresas que investem em P&D (que já redundou na demissão de milhares de profissionais especializados) e assistimos a uma paralisia de iniciativas como a Certics.
Ainda, é impossível deixar de citar a chamada “desoneração da folha de pagamentos”, lançada em 2011 e mantida como provisória por três anos, para ser abortada exatamente quatro meses depois de ter sido declarada ‘permanente’.
Ao mesmo tempo, a massificação das comunicações por meio da Internet e a computação em nuvem acirram a competição internacional entre as empresas do setor de TI: se há trinta anos as barreiras idiomáticas e a nossa idiossincrasia tributária eram barreiras para a entrada de soluções estrangeiras no Brasil, hoje uma empresa localizada em qualquer parte do planeta pode contratar e cooperar com uma equipe brasileira para incorporar esse know-how em suas soluções.
O Censo do Setor de Tecnologia da Informação, iniciativa levada pela Assespro ao longo dos anos a dezenas de países, revela de forma numérica e conclusiva que o Brasil é um país não apenas onde a quantidade e o volume de exportações estão entre os mais baixos, mas o mesmo acontece em interações internacionais como viagens a feiras e congressos.
Enquanto isso, até mesmo os nossos países vizinhos na América Latina implementam políticas públicas intensivas para o desenvolvimento baseado na TI. A Colombia vem crescendo a passos largos (ameaçando superar a Argentina como terceira economia da região, atrás de Brasil e México), e é a única nação da região que possui um ministério de Tecnologia da Informação que centraliza as decisões – no Brasil, a Secretaria responsável no MCT foi extinta.
A história de sucesso das exportações argentinas, iniciada após a crise de 2001, é hoje complementada por apoio integral do Ministério local de Ciência e Tecnologia a empresas locais que gerem patentes no Exterior (incluindo não apenas os custos, mas apoio jurídico) – no Brasil, as empresas não apenas tem que pagar tudo, como ainda tem a remessa de dólares taxada com Imposto de Renda na fonte, não reembolsável, pela contratação destes serviços no Exterior.
Não é de estranhar, portanto, que empresas oriundas destes países (o Chile foi pioneiro nessa ação, e será seguido por Colombia e Argentina) avancem sobre o mercado brasileiro, um gigante atraente para elas.
Enquanto isso, as empresas brasileiras têm reagido procurando subcontratar cada vez mais serviços no Exterior, como forma de operar com custos menores, fazer frente à falta de recursos humanos, entre outros. Porém, neste caminho a balança de pagamentos só tende a piorar; além de despertar a consciencia desta oportunidade em um número crescente de empresas de outros países.
Não temos outra saída, mesmo que com grande atraso, a não ser criar uma estratégia nacional de Tecnologia da Informação, se não quisermos ser perdedores nesta disputa global. Esta estratégia passa necessariamente pela requalificação de profissionais e empresas para enfrentar o novo cenário da tecnologia a nível global (incluindo aspectos tecnológicos e de gestão), um aumento da produtividade dos recursos humanos disponíveis, e a criação de mecanismos de premiação (tributários ou não) para as empresas que gerem inovações tecnológicas, principalmente as de maior impacto econômico.
Sabemos que as dificuldades políticas que o país atravessa não facilitam o processo de tomada de decisão necessário, mas é preciso que toda a sociedade brasileira tenha consciência da importância desta decisão. O “País do Futuro” (título de livro de Stefan Zweig, publicado em 1941) corre o risco de aumentar ainda mais sua dependência do Exterior no que diz respeito a produtos e serviços de Tecnologia da Informação, transformando-nos, de fato (na chamada “Era da Sociedade da Informação”) na maior economia do planeta com alto grau de dependência de produtos estrangeiros: ou seja, na mais perfeita “colônia do futuro”.
Desenvolvido por: Leonardo Nascimento & Giuliano Saito